Portugal Colonial - 'Tenho medo': a violência invade as salas de parto na Sérvia

'Tenho medo': a violência invade as salas de parto na Sérvia
'Tenho medo': a violência invade as salas de parto na Sérvia / foto: Oliver Bunic - AFP

'Tenho medo': a violência invade as salas de parto na Sérvia

Biljana Cicic-Stanic ainda treme ao lembrar da dor, da violência e da humilhação que sentiu ao dar à luz seu filho. Um parto infelizmente "trivial" nos hospitais da Sérvia, onde surgem cada vez mais relatos de violência obstétrica.

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Em Novi Sad, cidade do norte do país, Biljana conta que passou muito tempo sozinha na sala de parto.

Quando os profissionais de saúde chegaram, as enfermeiras a amarraram no leito, uma prática para pressionar violentamente o ventre da mulher para expulsar o bebê.

Ainda lembra os insultos dos profissionais. "Tudo era violento. Te metem em uma cama, te obrigam a ficar quieta enquanto alguém abre violentamente o colo uterino, corta sua membrana e te manda calar a boca", descreve.

Uma história triste e comum na Sérvia, onde a violência obstétrica é decorrente de uma mistura de valores patriarcais e uma legislação que pouco protege as mulheres.

O assunto saiu nos jornais no início de 2024, quando Marica Mihajlovic, uma mulher de origem romena, acusou publicamente seu obstetra de "pular em cima" e de proferir insultos racistas durante o parto.

Sua filha faleceu logo depois, uma morte causada por "parto violento", segundo a mãe.

Sua história desencadeou uma corrente de indignação, manifestações e motivou milhares de mulheres e falar.

"Todo mundo tem uma tolerância diferente a dor", se limitou a afirmar a ministra da Saúde sérvia, Danica Grujicic.

- Medo de dar à luz -

Segundo um estudo publicado em 2022 e baseado em centenas de depoimentos, as mulheres sérvias são vítimas constantes de violência nas maternidades, seja na região abdominal ou por atos realizados sem consentimento.

Insultos, gritos e humilhações também são frequentes, segundo o estudo. Inclusive na maior clínica obstétrica de Belgrado.

"Frequentemente os profissionais atuam contra a vontade das pacientes", escrevem os autores do estudo. "São amarradas caso se queixem de dor e após o parto, as episiotomias sem anestesia são comuns", detalham.

As que sofrem abortos também recebem tratamentos degradantes. "São deixadas sozinhas, obrigadas a abortar na cama", às vezes em dormitórios compartilhados com gestantes.

Biljana Brankovic, de 37 anos, viveu essa dor. Em 2021, a residente de Belgrado precisou interromper a gravidez de 24 semanas após descobrir malformações graves no feto.

Uma vez na clínica, a equipe médica a ignorou, ocupada demais olhando a televisão, conta à AFP.

"Deixa de ser histérica!" lhe disseram quando pediu ajuda. "Dez minutos depois, senti as contrações. Sozinha, sem enfermeira ou médico. Gritei por 10 minutos", lembra.

A equipe médica realizou uma curetagem sem anestesia, o que a deixou estéril, segundo três laudos médicos.

Um ginecologista concordou em falar com a AFP, de forma anônima, e reconheceu os problemas levantados pelo relatório, afirmando, no entanto, que a maioria dos médicos "faz bem o seu trabalho".

"Os hospitais devem documentar os casos de abuso. A responsabilidade é de quem dirige as instituições e não são penalizados os erros cometidos na sala de parto", afirma.

No entanto, sem reformas e com o desinteresse de uma parte da classe política, as mulheres sérvias que desejam ter filhos não têm outra escolha além de sentir medo.

Sladjana Spasojevic, que dará à luz em algumas semanas, ainda não sabe onde quer parir. As lembranças do nascimento de seu primeiro filho ainda a assombram.

"Meu maior medo é não saber para onde ir. Tenho medo de ir para o hospital e acabar com o mesmo médico", diz ela.

R.Veloso--PC