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Pode-se falar em crimes de guerra no conflito entre Israel e Hamas?
A onda de violência que começou no sábado, com a ofensiva sem precedentes do movimento palestino Hamas em solo israelense, levanta a questão sobre se foram cometidos crimes de guerra em Israel e na Faixa de Gaza.
A guerra começou há seis dias, quando membros do Hamas entraram em Israel e mataram mais de 1.200 pessoas, a maioria civis, e fizeram 150 reféns.
Israel respondeu com bombardeios incessantes contra a Faixa de Gaza, de onde partiram os combatentes do Hamas, que governa este enclave palestino. Pelo menos 1.354 palestinos morreram em Gaza até o momento.
Vários especialistas em direito internacional disseram à AFP que ambos os lados podem ser acusados de terem cometido crimes de guerra.
- Como se define um crime de guerra? -
Os "crimes de guerra" e os "crimes de lesa-humanidade" são definidos pelo Estatuto de Roma, que é o texto fundacional do Tribunal Penal Internacional (TPI).
Um crime de guerra é definido como uma violação grave do direito internacional contra civis e combatentes durante um conflito. Isto inclui atos que constituam uma "violação grave" da Convenção de Genebra de 1949, a qual estabelece o marco jurídico para as guerras, depois dos julgamentos de Nuremberg contra líderes nazistas.
Este quadro descreve mais de 50 atos considerados atrocidades, incluindo homicídio, tortura, estupro e tomada de reféns. Também engloba ataques intencionais contra assentamentos populacionais indefesos que não são "alvos militares".
Um "crime contra a humanidade" é definido como "um ataque generalizado, ou sistemático, dirigido contra qualquer população civil", incluindo "assassinato", "extermínio", "escravidão" e "deportação ou transferência forçada".
- O ataque do Hamas foi um crime de guerra? -
Melanie O'Brien, professora visitante de direito internacional na Universidade de Minnesota, nos Estados Unidos, observou que "há violações das leis da guerra por ambas as partes".
A acadêmica afirmou que, no caso do Hamas, um exemplo é a tomada generalizada de reféns.
Israel informou que o grupo palestino mantém cerca de 150 reféns, incluindo cidadãos americanos, alemães, mexicanos e tailandeses.
O'Brien citou ainda que o direito internacional proíbe "a violência orientada a semear o terror entre a população civil", o que, segundo ela, é o caso do lançamento de projéteis, por parte do Hamas, contra Israel.
Ben Saul, professor de direito internacional na Universidade de Sydney, disse acreditar que o caso do Hamas "é bastante claro".
"O assassinato deliberado de civis é um crime de guerra", frisou.
Um dos ataques mais letais contra civis já registrados em Israel foi o massacre cometido por membros do Hamas as mais de 200 pessoas que participavam de uma festa "rave" no deserto.
- Como foi a resposta de Israel? -
Saul disse à AFP que, por parte de Israel, pode-se citar "a declaração de um cerco total, que impede a entrada de alimentos, combustível, água, energia" na Faixa de Gaza.
"Em termos de responsabilidade penal, a fome é um crime de guerra", explicou.
O alto comissário da ONU para os Direitos Humanos, Volker Türk, lembrou na terça-feira que "a imposição de cercos que ponham a vida de civis em perigo, privando-os de bens essenciais à sua sobrevivência, é proibida pelo direito humanitário internacional".
O'Brien acrescentou que o Hamas e Israel têm-se bombardeado indiscriminadamente, o que também constitui um crime de guerra, já que não se atinge apenas o pessoal militar.
- Qual é o papel do TPI? -
Em 2021, o TPI abriu uma investigação sobre crimes cometidos nos territórios palestinos, que apura supostos crimes cometidos pelas forças israelenses e pelo Hamas, assim como por outros grupos armados palestinos.
Israel, que nunca assinou o Estatuto de Roma, nega-se a reconhecer sua jurisdição, ou a cooperar com a investigação que abarca possíveis crimes que remontam à guerra de 2014 em Gaza.
A questão é complicada pela forma como o conflito é definido, se for "nacional", ou "internacional", e pelo estatuto dos territórios palestinos, acrescentou Saul.
"A dificuldade com o tema de Gaza é que metade dos juristas internacionais diz que está ocupada, e a outra metade, que não está", afirmou.
"Se estiver ocupado, é um conflito internacional. A lista completa de crimes de guerra se aplica, em virtude do Estatuto de Roma", completou, acrescentando que "essa é uma questão jurídica importante para a Corte, que ainda não foi resolvida".
P.Mira--PC